13.2.08

Ala-Arriba

  Os sinos anunciam a saída da Procissão. Com os braços abertos, Nossa Senhora de Assunção, em frente ao porto de pesca, ao som das sereias e dos foguetes lançados das traineiras engalanadas, abençoa aqueles que no mar têm o seu ganha-pão, ou o seu leito de morte.


  Muitos anos atrás saía também a Procissão. No ar, um vagido se ouviu, mais alguém tinha nascido. Pelas cangostas andou. No antigo mercado saltou para juntar mais uma peça ao presépio; uma ovelhinha, o Menino Jesus, a Nª Senhora, o pastor... enquanto seu avô colocava mais um par de solas e, a sua companheira de uma vida, deambulava de aldeia em aldeia vendendo o que o mar dava.


  Com a sacola ao ombro e a sua lousa traçava, com pau de giz, as primeiras letras, B, A =BA.. Pela janela via o céu azul, o campo sem fim. A chuva, miudinha, caía durante semanas.

  De calção lá ia para a praia onde, feito miúdo Adão, se atirava enquanto na «Boca-do-Lobo» o mar fazia um barulho dos "diabos" e, todo o cuidado era pouco não fosse alguém ser engolido por aquela "garganta" escancarada.


  As traineiras ondulavam ao sabor das ondas e os barcos, na areia, aguardavam a chegada dos pescadores para mais uma ida ao mar. As mulheres olhavam para os seus "Ómes" rezando com fé para que a faina corresse bem.

  "Ala-Arriba", gritavam as pescadeiras que, em conjunto com os homens, puxavam o barco com o pescado...


... que era logo ali dividido e comercializado na lota de pesca.


  Correrias, brincadeiras, ora com umas fisgadas bem “amandadas”, ora brincando de cowboys e de índios, uns jogos de bola junto à Fortaleza e, o polícia, mesmo ali a multar pois não se podia jogar descalço, no tempo em que uma sardinha alimentava quase uma família.


 O silvo de um barco atroou os ares, na amurada, as crianças viam o barco a desencostar do cais de embarque e a partir para o alto mar. No cais, lenços diziam adeus a quem partia...


 ... E, assim, se passaram horas, dias, anos!...

  Tocam os sinos, os foguetes estalejam... Vai sair a Procissão!

 Para a Poveira, minha mãe, um beijo do tamanho do mundo e desculpa ter-te feito "perder" a Festa da Assunção nesse ano!


 Ala-Arriba! é uma expressão poveira que significa "força (para cima)".

2 comentários:

Anónimo disse...

Okei Mário, tenha a certeza que vai ser um espectáculo quando, lá mais para a frente, tiver os ingredientes necessários que tu, certamente, irás encontrar!
Se quizeres envio CD do rancho de Aver-o-Mar!
ALA-ARRIBA PELA PÒVOA!

Manuel Lopes

Leao Verde disse...

Mano Marius,
Magnifico trabalho este com que delicias os poveiros e por certo gentes de outras zonas geográficas deste país que este teu tema percorram.
Só tu é que poderias fazer esta pesquisa em que pudesses fazer reviver aquela Póvoa antiga, aquela Póvoa de gente dedicada à terra, à labuta ardua, à luta de um povo ... o chamado "povo poveiro", que nas agruras da vida sempre soube encarar aquele seu presente e o seu futuro próximo de muita angustia, de muito sofrimento, de muita miséria, com um sorriso no rosto, sorriso de vencedor, sorriso muitas vezes de tristeza, mas sempre com um olhar firme de quem sabe que há-de vencer as desditas da vida, um sorriso afável de bem receber a quem procuravam a "sua" Póvoa para descansar, para desfrutar as delicias do mar, da sua gastronomia, do seu encanto.
Fizeste-me percorrer ruas, jardins, casario e belos edificios da nossa infância, do nosso correr por aquela então Vila da Póvoa de Varzim.
"Relembrei" coisas que NUNCA vi, mas que sempre estiveram connosco através dos contares dos nossos avós, dos nossos pais.
E com a mostra das imagens do comentário sobre a Póvoa DO Varzim, soubeste respeitar a tradição das musicas e cantares poveiros,dando-lhes corpo e alma naquelas imagens de rara beleza, ainda que sem serem em tons coloridos.
Penso que deverias colocar nesta página deste teu blog todos os temas dedicados à Póvoa e aos seus ilustres Poveiros que tens no "Deixa-me". Enriquecerias este teu espaço com todos esses temas e a Póvoa agradecer-te-ía.
Como Poveiro agradeço este teu esforço, esta tua dedicação, este teu querer.
Como irmão envio-te um forte abraço, gritanto um ALA-ALA-ARRIBA.

À nossa Póvoa também já tinha escrito um poema que creio poder aqui colocá-lo.

PÓVOA DE VARZIM

1
Póvoa, meu berço de nascença,
De ti encerro lembrança,
E com bastante crença,
Dos meus tempos de criança.
2
Minha alma ainda contém
Recordações da mocidade,
Meu olhar até agora mantém
O mesmo orgulho e vaidade.
3
Tuas praias de areias sem igual,
Apinhadas no solstício do Verão,
São das mais belas de Portugal,
Percorro-as com muita emoção.
4
Nas tuas noites belas e quentes
Moças de corpos bronzeados,
Com risos alegres e contentes
Buscam novos olhares amados.
5
Mesmo no tempo agreste,
Ou na canícula do Verão,
És o sonho lindo que me deste
Encerro-te em meu coração.
6
Quando a cidade foste elevada
Em 16 de Junho de 1973,
Passaste a ser mais amada
Teu crescimento foi de vez.
7
Agora muito mais crescida,
Com novos melhoramentos,
Ficas mais bela assim vestida
Com esses outros ornamentos.
8
Porém não mais esquecerei
Que já foste pequenina,
Teus lindos jardins recordarei
De quando ainda eras menina.
9
Mas sei que estás contente,
Que assim te sentes feliz,
Neste teu crescer permanente
Vês teu nascimento e sorris.
10
A quem te queira para sempre
Que tenhas muito para dar,
Eu te quero com desejo ardente
Póvoa de Varzim, Póvoa do mar.

Leão Verde
Póvoa Varzim, Junho 2003